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segunda-feira, 1 de agosto de 2011

GATOS e FEMINILIDADE




A primeira afirmação é a mais fácil. Simbolicamente, o gato é sempre associado às mulheres. A divindade egípcia Bastet, onde os gatos chegaram a ser adorados, é uma deusa, equanto a divindade chacal, um parente do cão, é um deus (Anúbis). Os gatos foram fortemente associados às bruxas, morrendo com elas nas fogueiras da ignorância e sendo responsabilizados por crimes sobrenaturais, como roubar a alma de crianças. Até hoje, há quem afirme o absurdo de que gatos transmitem asma, curiosa e especialmente, para crianças. Visto que asma nem sequer é contagiosa, e ainda que fosse, o seria tanto contra crianças quanto contra adultos, essa afirmação é tão fantasiosa que só pode ser a versão moderna desta superstição.]
Gatos são animais sensuais, eles se esfregam, se roçam, são sedutores, e por isso consideramos as mulheres bonitas como "gatas", ou "panteras", que são versões macro dos gatos. A beleza é uma virtude que sempre nos soa feminina, Afrodite, a deusa da beleza, é uma mulher. Mesmo quando se chama um homem de "gato", faz-se alusão à uma característica feminina. No nordeste brasileiro há até a estranha expressão "gato véio" (assim mesmo, no masculino), para se referir à mulher de vida sexual ativa.
Passeando no supermercado, observe as capas de ração para animais. Você notará que nas de rações caninas encontram-se mais homens do que mulheres, e muitas vezes o cão olha diretamente para o dono. Na capas de rações felinas, quando há humanos, SEMPRE são mulheres, e o gato jamais está olhando para a dona.
A parceria gato-mulher e cão-homem pode ser quase tão antiga quanto a humanidade, visto que os cães eram companheiros de caça, ou guardiões de território, atividade que também cabia aos homens. Já os gatos, sendo mais caseiros, ficavam mais próximos das mulheres.
Em inglês, essa associação é ainda mais flagrante. O andar rebolado, atitude tipicamente feminina, é catwalk, e a palavra pussy se aplica tanto ao felino quanto à genitália feminina. Por outro lado, o andar dos cães é bem mais "másculo", muitas vezes um trote, e eles nunca cruzam as pernas ao andar, característica fundamental do rebolado feminino, pelo contrário, andam com as pernas abertas, característica típica do andar masculino.
Vamos insistir na comparação gatos e cães e veremos como essa associação vai ainda mais longe. Os cães, como já foi dito, são na língua inglesa frequentemente chamados de buddies, um termo sem tradução literal que significa um amigo/parceiro masculino de um homem. E não é só na caça que cães e homens têm andado juntos, mas em praticamente todos os símbolos.
O lobisomen, sendo o lobo uma versão do cão, sempre é um homem, mas quando se pensa em associar um gato a um humano, a mulher é colocada automaticamente. Os poucos 'homens-gatos' e 'mulheres-lobo' só apareceram quando o imaginário já estava saciado com 'mulheres-gato' e 'homens-lobo', lembrando que as mulheres só são associadas a lobas em idades pós-balsaquianas.
Uma estória que capturou bem essa relação de gênero é The Cat that Walked by Himself do escritor britânico Rudyard Kipling, (autor de Mogli, o menino-lobo) que no livro Just So Stories conta esta estória, cujo título significa "O Gato que Andava Sozinho/Por conta própria", e é apresentada uma forma lendária muito comum, que remonta a um fabuloso passado onde os animais falavam, e onde os eventos decorridos explicam suas características atuais.
Os animais eram todos livres, mas o cão trocou sua liberdade pela parceria com o homem na caça, recebendo costela de carneiro assada como pagamento. A vaca também o fez em troca de receber a mais suculenta das relvas ao passo que fornecia leite para os humanos, o cavalo também, passando a ser montaria do homem.
Evidentemente cavalo e cão passaram a trabalhar com o homem, e a vaca e o gato com a mulher, na casa. O gato, entretanto, não abriu mão de sua liberdade, fazendo um pacto secreto com a mulher, sem o conhecimento do homem, no qual se encarregava de divertir e acalmar as crianças, e eliminar os ratos, tão temidos pelas mulheres. Não ter cedido sua independência, no entanto, teve um preço, e o gato foi condenado a ser odiado por 3 a cada 5 homens bons, e a ser perseguido pelo cão.
Enfim, os exemplos são tão vastos que não parece necessário citá-los mais, no entanto essa estória reflete a clara divisão de papéis sociais, a mulher em casa, na vida doméstica, e o homem vai ao trabalho, à caça, e se os cães estão em harmonia com a atividade masculina, e os gatos com a feminina, por outro lado, há um anacronismo no fato do gato permanecer livre para andar por onde quiser, tendo o direito de ir e vir.
E é aí que está a chave para o entendimento do problema, pois embora seja um símbolo do feminino, o gato não é um representante direto da feminilidade típica socialmente sacramentada, mas sim da feminilidade oculta, livre e independente, que nossa civilização, há milhares de anos, tem lutado para reprimir.

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